Capa de um dos 10 livros que Armando escreveu
Hoje, faleceu o jornalista esportivo Armando Nogueira. Durante muito tempo ele escreveu uma coluna chamada Na Grande Área. Essa coluna era publicada em vários jornais de todo o país, inclusive no Diário de Natal/O Poti.
No início, eu não gostava dessa coluna, talvez por não nunca falar do Futebol Potiguar, depois passei a ler e num certo domingo me deparei com este texto. Ele foi publicado no Poti/Diário de Natal de agosto de 1996.
Nunca mais este texto saiu da lembrança. Segue:
É o caso de um feirante de peixes num porto britânico. O homem chega à feira e lá encontra seu compadre, arrumando os peixes num imenso tabuleiro de madeira. Cumprimentam-se.
O feirante está contente com o sucesso do seu modesto comércio. Entrou no negócio há poucos meses e já pode até comprar um quadro-negro para badalar seu produto. Atrás do balcão, num quadro-negro, está a mensagem, escrita a giz, em letras caprichadas:
“Hoje, vendo peixe fresco.” Pergunta, então, ao amigo o compadre: Você acrescentaria mais alguma coisa? O compadre releu o anúncio. Discreto, elogiou a caligrafia.
Como o outro insistisse, resolveu questionar. Perguntou ao feirante: Você já notou que todo dia é sempre hoje? E acrescentou: Acho dispensável. Essa palavra está sobrando…
O feirante aceitou a ponderação: apagou o advérbio. O anúncio ficou mais enxuto: “Vendo peixe fresco.” — Se o amigo me permite — tornou o visitante —, gostaria de saber se aqui nessa feira existe algum peixe dado de graça.
Que eu saiba, estamos numa feira, e feira é sinônimo de venda. Acho desnecessário o verbo. Se a banca fosse minha, sinceramente, eu apagaria o verbo.
O anúncio encurtou ainda mais: “Peixe fresco” — Me diga uma coisa: por que apregoar que o peixe é fresco? O que traz o freguês a uma feira, no cais do porto, é a certeza de que todo peixe, aqui, é fresco.
Não há no mundo uma feira livre que venda peixe congelado… E lá se foi também o adjetivo. Ficou o anúncio reduzido a uma singela palavra: “Peixe”.
Mas por pouco tempo. O compadre pondera que não deixa de ser menosprezo à inteligência da clientela anunciar, em letras garrafais, que o produto aqui exposto é peixe.
Afinal, está na cara. Até mesmo um cego percebe, pelo cheiro, que o assunto, aqui, é pescado… O substantivo foi apagado. O anúncio sumiu. O quadro-negro também. O feirante vendeu tudo. Não sobrou nem a sardinha do gato. E ainda aprendeu uma preciosa lição: escrever é cortar palavras.
Do Blog do Trindade: talvez no jornalismo esportivo também seja.
Hoje, faleceu o jornalista esportivo Armando Nogueira. Durante muito tempo ele escreveu uma coluna chamada Na Grande Área. Essa coluna era publicada em vários jornais de todo o país, inclusive no Diário de Natal/O Poti.
No início, eu não gostava dessa coluna, talvez por não nunca falar do Futebol Potiguar, depois passei a ler e num certo domingo me deparei com este texto. Ele foi publicado no Poti/Diário de Natal de agosto de 1996.
Nunca mais este texto saiu da lembrança. Segue:
É o caso de um feirante de peixes num porto britânico. O homem chega à feira e lá encontra seu compadre, arrumando os peixes num imenso tabuleiro de madeira. Cumprimentam-se.
O feirante está contente com o sucesso do seu modesto comércio. Entrou no negócio há poucos meses e já pode até comprar um quadro-negro para badalar seu produto. Atrás do balcão, num quadro-negro, está a mensagem, escrita a giz, em letras caprichadas:
“Hoje, vendo peixe fresco.” Pergunta, então, ao amigo o compadre: Você acrescentaria mais alguma coisa? O compadre releu o anúncio. Discreto, elogiou a caligrafia.
Como o outro insistisse, resolveu questionar. Perguntou ao feirante: Você já notou que todo dia é sempre hoje? E acrescentou: Acho dispensável. Essa palavra está sobrando…
O feirante aceitou a ponderação: apagou o advérbio. O anúncio ficou mais enxuto: “Vendo peixe fresco.” — Se o amigo me permite — tornou o visitante —, gostaria de saber se aqui nessa feira existe algum peixe dado de graça.
Que eu saiba, estamos numa feira, e feira é sinônimo de venda. Acho desnecessário o verbo. Se a banca fosse minha, sinceramente, eu apagaria o verbo.
O anúncio encurtou ainda mais: “Peixe fresco” — Me diga uma coisa: por que apregoar que o peixe é fresco? O que traz o freguês a uma feira, no cais do porto, é a certeza de que todo peixe, aqui, é fresco.
Não há no mundo uma feira livre que venda peixe congelado… E lá se foi também o adjetivo. Ficou o anúncio reduzido a uma singela palavra: “Peixe”.
Mas por pouco tempo. O compadre pondera que não deixa de ser menosprezo à inteligência da clientela anunciar, em letras garrafais, que o produto aqui exposto é peixe.
Afinal, está na cara. Até mesmo um cego percebe, pelo cheiro, que o assunto, aqui, é pescado… O substantivo foi apagado. O anúncio sumiu. O quadro-negro também. O feirante vendeu tudo. Não sobrou nem a sardinha do gato. E ainda aprendeu uma preciosa lição: escrever é cortar palavras.
Do Blog do Trindade: talvez no jornalismo esportivo também seja.
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